6 de mar. de 2016

Desenhador


Quando eu era criança, queria ser Desenhista Profissional, queria fazer Animação, como os desenhos que via na TV naquela época. Lembro bem amargamente quando eu disse que um dia faria aquilo (apontando para o desenho na televisão), mas riram debochando da minha cara, dizendo "Ah, sim, vai sim!". Sim, eu venho de uma família repleta de filhos da puta.

Quando terminei o Ensino Médio, na época ainda era chamado de Segundo Grau, não sabia bem o que fazer, porque a escola não preparava o aluno para nada: nem para continuar seguindo os estudos em Nível Superior, nem para buscar o mercado de trabalho. Isso foi em 1994, época em que se começava a estabilizar o país, depois de inflações que chegavam a mais de 100% ao mês e muitas crises políticas, como o Impeachment de Collor e um país totalmente falido, embora ainda houvesse alguma moralidade, já que a corrupção não era institucionalizada como é hoje. Lembro, inclusive, por essa época, que o Papa João Paulo II havia determinado como pecado mortal a corrupção e o desvio de dinheiro público.

Nessa época, a opção era procurar emprego na padaria ou supermercado. Não sabia nada de nada sobre profissões e nunca me disseram que eu poderia seguir alguma carreira se entrasse para a faculdade, que era visto como algo para gente ou muito inteligente ou muito rica. Bem, como nunca fui nem um e nem outro, restava os subempregos de balcão, para ganhar um salário mínimo que era bem mais mínimo do que é agora. Apesar de toda putaria política da nossa atualidade, não se pode negar que em termos de oportunidade de estudo e trabalho, a coisa melhorou consideravelmente.

Mas acha que alguém orgulhosa como eu iria querer parar atrás de um balcão, perder um dia inteiro, uma semana inteira, para ganhar uns trocados miseráveis? Não, era orgulhosa demais para isso, achava que era superior demais para esse tipo de coisa!

Então fiz uma das muitas escolhas erradas que fiz na vida: quis me dedicar ao desenho, pois queria ser Desenhista! Fui fazer cursos em Senac, achando que aquilo prestava para algo. E realmente me dediquei à coisa, muito mesmo. Estudei através de livros, revistas e cursos. O problema é que essa insanidade não durou apenas um ano... mas dez!

Obviamente, não me tornei a Desenhista Profissional como sempre almejei e até (pelo menos isso) batalhei muito para tal. Primeiro que NÃO EXISTE mercado para Desenhistas no Brasil. A coisa é como a profissão de farmacêutico: basta um para atender 100 drogarias de uma mesma rede. Sabe como é: brasileiro, por uma questão tradicional de descaso com tudo que não preenche seus dois buracos (a boca e o cu), não dá valor algum para a Arte, ainda menos dará valor para algo que mais parece subarte, como o desenho. Segundo, eu realmente jamais tive a qualidade necessária para conseguir concorrer no tão minguado mercado artístico brasileiro.

Portanto, o máximo que cheguei foi na categoria de Desenhador.

Não ganhei dinheiro com isso, teria passado fome e morado debaixo da ponte se não fosse minha mãe e meu tio, haha! Mas não quer dizer que não "trabalhei" com desenho. Sim, isso fiz e até muito. E publiquei. Se na época não havia a facilidade da Internet, a gente se virava nos 30 e publicava mesmo assim, até fora do país. Para isso, havia as publicações alternativas e independentes, o que seriam hoje os Blogs, Deviant Arts, Amazons e Facebooks da vida: revistas e jornais feitos na cara e na coragem, distribuídos em eventos ou pelos correios (sim, naquela época os Correios entregavam até cartas de R$ 0,01, é sério!). Nessa brincadeira fiquei por quase 10 anos, tendo trabalhos publicados em todo o Brasil e até mesmo no Japão, Estados Unidos, Portugal e Espanha. Graças a amigos poetas, também na Alemanha, França, Grécia, Rússia! Dá pra acreditar? Claro que, trabalho remunerado que é bom, nada! Fama também não, apesar da exposição.

Mas vou te contar uma coisa... ô categoriazinha mais invejosa é essa a de desenhistas! Talvez por ser um mercado quase inexistente, era uma vaidade exarcerbada as dos desenhistas, invejas, puxões de tapetes, essas coisas. Você precisava estar inserido em uma panelinha e o seu mundinho só rodava aquela panelinha. Fora isso era uma luta marcial entre um bando de rabiscadores, a grande maioria sem talento real para a coisa.

Então, os aborrecimentos eram muitos. Como editor de fanzine, comecei a me estressar com desenhistas tendo ataques de estrelismos. Não tinha a mesma oportunidade que eu própria dava aos outros nas minhas publicações. E ainda era prejuízo financeiro, porque eu que pagava por tudo para dar revista de graça para os outros, inclusive pagando o frete. Felizmente, até mesmo a burrice tem limite, e chegou uma hora que joguei TUDO isso para o alto e parei geral. E olha que eu estava bastante conhecida nesse meio alternativo, de uma ponta a outra do Brasil.

Daí que eu já estava velha demais para continuar nessa brincadeira. Precisava, NECESSITAVA acordar para a vida, começar a viver feito gente grande. E o desenho, que era a minha paixão obsessiva, se tornou o meu mais odioso inimigo, e todas aquelas frustrações acumuladas em relação a tudo (vida, família, falta de empregos e oportunidades, e outras merrecas desse porte) acabaram sendo descontadas no pobre desenho. Consegui formar um bloqueio tão grande em relação a isso que, literalmente, eu passava mal só em pegar num lápis! Sabe o que é ter náuseas e alteração de pressão só em cogitar a possibilidade de praticar determinada ação? Isso é estresse pós-traumático grave! Só faltava o ataque epilético, hehe!

Mas o tempo passou e algo se operou. Uma cura ocorreu, ou melhor, está em processo, encaminhando. Após ter estado mais de um ano sem produzir qualquer coisa (nem postagem para os blogs, como pode notar no Arquivo de Postagens), comecei a me desesperar com isso. Quando você nasce com determinada predisposição, se você for contra a esse fluxo vital, você pira, adoece. E isso é sério. Quando você contém um fluxo, ele ou cessa de jorrar até secar ou ele continua a jorrar, mas fica preso numa barragem. Em ambos os casos, o prejuízo existencial é grande, ocasionando doenças, inclusive mentais. E a estagnação é a PIOR coisa que pode ocorrer a qualquer criatura.

E se a cura está se operando, está também se operando em outros níveis, especialmente o emocional. Pois não apenas cogito a possibilidade de voltar a me dedicar ao desenho e pintura, mas também percebo a leveza que está acompanhado disso: não estou preocupada em fazem algo bom e perfeito, mas apenas em FAZER. Quero apenas desenhar e trabalhar a Criatividade, seja isso conveniente ou não, interessante ao mundo ou não. Quero apenas fazer, e apenas por mim. Se atingir outras pessoas, será lucro inesperado. Sem comparações, sem ilusões de alcançar uma qualidade e uma perfeição de que não sou capaz.

Penso nisso como na Parábola dos Talentos, contada por Jesus, que diz o seguinte:
Mateus 25:14—30 — A Parábola dos Talentos

14 Pois será como um homem que, ausentando-se do país, chamou os seus servos e lhes confiou os seus bens.

15 A um deu cinco talentos, a outro, dois e a outro, um, a cada um segundo a sua própria capacidade; e, então, partiu.

16 O que recebera cinco talentos saiu imediatamente a negociar com eles e ganhou outros cinco.

17 Do mesmo modo, o que recebera dois ganhou outros dois.

18 Mas o que recebera um, saindo, abriu uma cova e escondeu o dinheiro do seu senhor.

19 Depois de muito tempo, voltou o senhor daqueles servos e ajustou contas com eles.

20 Então, aproximando-se o que recebera cinco talentos, entregou outros cinco, dizendo: Senhor, confiaste-me cinco talentos; eis aqui outros cinco talentos que ganhei.

21 Disse-lhe o senhor: Muito bem, servo bom e fiel; foste fiel no pouco, sobre o muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor.

22 E, aproximando-se também o que recebera dois talentos, disse: Senhor, dois talentos me confiaste; aqui tens outros dois que ganhei.

23 Disse-lhe o senhor: Muito bem, servo bom e fiel; foste fiel no pouco, sobre o muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor.

24 Chegando, por fim, o que recebera um talento, disse: Senhor, sabendo que és homem severo, que ceifas onde não semeaste e ajuntas onde não espalhaste,

25 receoso, escondi na terra o teu talento; aqui tens o que é teu.

26 Respondeu-lhe, porém, o senhor: Servo mau e negligente, sabias que ceifo onde não semeei e ajunto onde não espalhei?
27 Cumpria, portanto, que entregasses o meu dinheiro aos banqueiros, e eu, ao voltar, receberia com juros o que é meu.

28 Tirai-lhe, pois, o talento e dai-o ao que tem dez.

29 Porque a todo o que tem se lhe dará, e terá em abundância; mas ao que não tem, até o que tem lhe será tirado.

30 E o servo inútil, lançai-o para fora, nas trevas. Ali haverá choro e ranger de dentes.
Claro que estou exagerando, mas tenho pensado muito no que eu vou apresentar aos meus Superiores quando "voltar pra casa"! Além de não ter feito nada para melhorar o mundo o mínimo que fosse, ainda enterrei um "talento" que me foi confiado o.O

Bom, depois dessa introdução que mais parece capítulo de livro, vamos ao objetivo principal desta postagem. Sim, com essa coisa de Cura e Desbloqueio, estou ficando mais eloquente ¬¬ sei que isso não é apreciável à essa geração dos 180 caracteres.

Com o processo de Cura ocorrendo, veio primeiro a ideia de fazer um curso de pintura, pois sempre quis aprender a pintar telas. Veio como uma ideia que não dei importância, mas agora percebo que isso deveria ser alguma sugestão sendo sussurrada em meu ouvido. A sugestão continuou encoando, pois precisava fazer algo em oposição ao nada que fiz desde o luto das eleições presidenciais passadas (foi aí que começou a minha troca de pés pelas mãos no ano passado). Mas ainda era uma ideia distante, mera sugestão. Onde farei um curso desses? E quanto custa um treco desses? Pois bem, não dei importância. Até outro dia... acredite ou não, tudo emergiu, veio à tona, no dia 29 de fevereiro!

Será que há mesmo algum poder oculto nessa data??

Precisava fazer uma postagem sobre o 29 de fevereiro, afinal era um dia peculiar. Não tinha nada a dizer, mas precisava. E a coisa toda aconteceu por causa do Doodle do Google daquele dia. Queria colocar o gif na postagem e fui procurar no Google Imagens, foi então que descobri o que é, realmente, um Doodle! Pronto, a coisa eclodiu :D

No dia seguinte, fui à rua à cata de material de desenho. Apesar de ainda ter alguma coisa em estoque, eu precisava de material novo, como um caderno de croquis que jamais fiz uso antes, pois sempre usei folhas avulsas. Choveu muito naquele dia e preferi não me arriscar a descer para o Centro do Rio, onde eu encontraria uma maior quantidade de oferta de material. Fui num bairro ali perto de casa, pois onde moro não há lojas que vendem esse tipo de material. Não encontrei grandes coisas, mas o suficiente para dar algum estímulo. 

Não encontrei nenhum Moleskini, e mesmo se encontrasse, não poderia comprar de qualquer forma, haha. Mas fiquei muito satisfeita de encontrar um sketchbook da Canson, e havia em quatro tamanhos diferentes e optei por um intermediário, no formato pequeno do A5. Para o que pretendo fazer, não preciso e nem é conveniente dimensões maiores, e até devia ter optado pelo menorzinho, no tamanho de uma caderneta normal.

E veio os lápis grafite, que sempre prefiro de maior gramatura, mais macios, pois tenho a mão muito leve e acabo não enxergando o que estou fazendo com lápis em gramaturas menores. Minhas opçãos são do 6B em diante. Peguei apenas dois da linha profissional da Faber Castel e um do Koh-I-Noor de gramatura 8B para experimentar, já que nunca usei a marca.

Uma lapiseira com borracha plástica comum, três canetas hidrográficas de ponta finíssima que achei avulsas e em promoção (pretendo rabiscar uns patchworks e mandalas), e duas canetas-nanquim, que são muito úteis e indispensáveis, embora eu ainda prefira o clássico bico de pena com tinta nanquim líquida que, modéstia a parte, domino bem a técnica.

Dois dias depois, na minha outra folga, comprei uma caixa pequena de lápis de cor, que veio com dois brindezinhos extras, da Staedtler, para testar a qualidade. O que me motivou a compra foi o fato da caixa ser importada da Alemanha, considerada uma das melhores fabricantes de material artístico do mundo. Fiz um pequeno teste quando cheguei em casa e, realmente, apesar de ser lápis de cor escolar, a qualidade do material é satisfatória, sendo uma boa opção para quem não pode pagar por uma caixa de lápis profissional, que não sai por menos de R$ 100 com apenas 12 cores... e olha que eu tinha uma caixa com 48 cores da linha Polychromos da Faber Castell, e vendi por R$ 70, sendo que custa mais de R$ 400 na loja!! Pelo menos soube que fiz uma desenhista feliz e que estava fazendo muito bom uso do material, coisa que muito mal fiz, embora tivesse o estojo há uns 20 anos!

Bem, é isso. Nem dá pra chamar de resumo da ópera, pois que a postagem virou uma ópera inteira! Mas, que seja! Já estive contida por tempo demais :)

Depois retorno com mais aquisição de materiais de desenho e pintura, além dos primeiros trabalhos após todo esse celibato!




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